O
cortiço
Aluísio
de Azevedo
João
Romão, português, bronco e ambicioso, ajuntando dinheiro a poder
de penosos sacrifícios, compra pequeno estabelecimento comercial no
subúrbio da cidade (Rio de Janeiro). Ao lado morava uma preta,
escrava fugida, trabalhadeira, que possuía uma quitanda e umas
economias. Os dois amasiam-se, passando a escrava a trabalhar como
burro de carga para João Romão. Com o dinheiro de Bertoloza (assim
se chamava à ex-escrava), o português compra algumas braças de
terra e alarga sua propriedade. Para agradar a Bertoleza, forja uma
falsa carta de alforria. Com o decorrer do tempo, João Romão
compra mais terras e nelas constrói três casinhas que
imediatamente aluga. O negócio dá certo, os novos cubículos se vão
amontoando na propriedade do português. A procura de habitação é
enorme, e João Romão, ganancioso, acaba construindo vasto e
movimentado cortiço.
Ao
lado vem morar outro português, mas de classe elevada, com certos
ares de pessoa importante, o Senhor Miranda, cuja mulher leva vida
irregular. Miranda não se dá com João Romão, nem vê com bons
olhos o cortiço perto de sua casa. No cortiço moram os mais
variados tipos: brancos, pretos, mulatos, lavadeiras, malandros,
assassinos, vadios, benzedeiras etc. Entre outros: a Machona,
lavadeira gritalhona, "cujos filhos não se pareciam uns com os
outros"; Alexandre, mulato pernóstico; Pombinha, moça
franzina que se desencaminha por influência das más companhias;
Rita Baiana, mulata faceira que andava amigada na ocasião com
Firmo, malandro valentão; Jerônimo e sua mulher, e outros mais. João
Romão tem agora uma pedreira que lhe dá muito dinheiro. No cortiço
há festas com certa freqüência, destacando-se nelas Rita Baiana
como dançarina provocante e sensual, o que faz Jerônimo perder a
cabeça. Enciumado, Firmo acaba brigando com Jerônimo e, hábil na
capoeira, abre a barriga dó rival com a navalha e foge. Naquela
mesma rua, outro cortiço se forma. Os moradores do cortiço de João
Romão chamam-no de "Cabeça-de-gato"; como revide,
recebem o apelido de "Carapicus". Firmo passara a morar no
"Cabeça-de-Gato", onde se torna chefe dos malandros. Jerônimo,
que havia sido internado em um hospital após a briga com Firmo,
arma uma emboscada traiçoeira para o malandro e o mata a pauladas,
fugindo em seguida com Rita Baiana, abandonando a mulher. Querendo
vingar a morte de Firmo, os moradores do "Cabeça-de-gato"
travam séria briga com os "Carapicus". Um incêndio, porém,
em vários barracos do cortiço de João Romão põe fim à briga
coletiva.
O
português, agora endinheirado, reconstrói o cortiço, dando-lhe
nova feição e pretende realizar um objetivo que há tempos vinha
alimentando: casar-se com uma mulher "de fina educação",
legitimamente. Lança os olhos em Zulmira, filha do Miranda.
Botelho, um velho parasita que reside com a família do Miranda e de
grande influência junto deste, aplaina o caminho para João Romão,
mediante o pagamento de vinte contos de réis. E em breve os dois
patrícios, por interesse, se tornam amigos e o casamento é coisa
certa. Só há uma dificuldade: Bertoleza. João Romão arranja um
piano para livrar-se dela: manda um aviso aos antigos proprietários
da escrava, denunciando-lhe o paradeiro. Pouco tempo depois, surge a
polícia na casa de João Romão para levar Bertoleza aos seus
antigos senhores. A escrava compreende o destino que lhe estava
reservado, suicida-se, cortando o ventre com a mesma faca com que
estava limpando o peixe para a refeição de João Romão. |