A
hora e vez de Augusto Matraga
Guimarães
Rosa
Guimarães
Rosa (1908-1967) converteu o sertão em linguagem, transferindo-o
para o oco do coração do homem. Viver tornou-se, então, muito
perigoso. Mas há de se a arriscar, como o fez Riobaldo, seu
personagem mais conhecido, ao empreender a temível travessia do
sertão da alma, o desafio do homem diante das forças do bem e do
mal. Poeta? Prosador? Guimarães Rosa confunde os limites literários
assim como os limites entre pensar e sentir. Dessa forma é que
experimentamos o destino de seus personagens, como parte de nossos
destinos, mas também refletimos sobre essas vidas para delas
extrair as melhores lições.
A
Hora e vez de Augusto Matraga, narrativa que integrava o primeiro
volume de contos do autor Sagarana (1967), é uma boa porta de
entrada no universo encantado da ficção rosiana. Augusto Esteves,
Nhô Augusto, Augusto Matraga (os três nomes se referem a um só
personagem) são os passos da travessia de um homem ao encontro de
seu destino - buscado e construído na dor, mas também na alegria,
no encontro com o sagrado e no desfrute do mundano - sua hora e sua
vez. Nhô Augusto era dono de gado e de gente. Mas, numa virada da
vida, 'descendo ladeira abaixo' perdeu tudo, incluindo a mulher que
fugiu com outro, levando-lhe a filha junto. A partir desse ponto a
narrativa poderia decorrer da cobrança de uma dívida de honra,
como aconselhou o empregado Quim: “... eu podia ter arresistido,
mas era negócio de honra, com sangue só para o dono”.No entanto,
Nhô Augusto renuncia à vingança, mas não à honra, e se regozija
ao fim, radiante, ao se deparar com a hora e vez de ser Matraga, o
homem que escolheu ser. Homem capaz de agir com coragem, justiça,
fraternidade e compaixão. |